Mídia, História e Memória dos Campos Gerais do Paraná
Felipe Simão Pontes[2] e Sérgio Luiz Gadini[3] (UEPG-PR)
Resumo: O texto apresenta uma análise dos principais meios impressos existentes na cidade de Ponta Grossa (PR), até a década de 1940, especialmente o jornal Diário dos Campos. O referido estudo, que envolve um mapeamento histórico dos principais veículos impressos registrados na cidade, leva em consideração a linha editorial, forma de composição textual, marcas discursivas, gêneros predominantes, periodicidade, público-alvo, alcance e influência social dos respectivos periódicos. O texto apresenta ainda algumas características em torno dos modos como a imprensa participava da vida social, política e cultural da região (Campos Gerais do Paraná), seja no que diz respeito à democratização dos espaços públicos, debates políticos ou afins e, pois, como a produção jornalística também foi participando das relações instituintes da realidade social de abrangência, ação e influência.
Palavras-chaves: História do jornalismo, história da imprensa paranaense, mídia impressa em Ponta Grossa/PR
Introdução
Este artigo tem a preocupação de tecer um breve relato sobre a história do jornalismo em Ponta Grossa desde sua origem em 1893 até 1940. Procura-se, num primeiro momento, contextualizar os Campos Gerais e a cidade de Ponta Grossa, mostrando como se deu o seu desenvolvimento no final do século XIX e como isso criou um campo propício para a atividade cultural da cidade.
A partir deste contexto, relata-se o surgimento da imprensa, a história dos principais jornais (especialmente do Diário dos Campos) e as principais figuras que participaram da construção do jornalismo em Ponta Grossa. Usam-se como fontes o arquivo de jornais do Museu Campos Gerais, livros sobre Ponta Grossa e relatos de jornalistas que participaram e registraram como era o fazer jornalístico da época.
Considerações teóricas
Com a emergência de uma nova ordem social representada pela industrialização do século XIX, o espaço público se configura sob a forma da urbanização. Surgem então aglomerados populacionais que desenvolvem um novo tipo de homem, apto às transformações culturais que este espaço adquire, transformando suas ações, estabelecendo novas formas de relação e criando a dinâmica social que se pode definir como modernidade.
O registro desta transformação, as manifestações cotidianas, as novas correlações de forças são trabalhadas diariamente, dando um ritmo lento e detalhado. Quando se olha do presente, cai-se na tentação de conclusões redutoras que não observam os pequenos movimentos, mas juntam tudo numa rápida transformação. Na análise de Miguel Morey, que prefacia a obra de Marocco (2004, p 09),
o jornalismo nasce da vontade de realizar–se com essa crônica do dia-a-dia de todo o memorável, persegue, desde o primeiro dia, o seu monopólio e, desde o primeiro dia, defende o seu próprio protagonismo, convencido, de que fora do jornalismo não há lugar para a história. E se é certo que hoje, encontramos passo a passo com a crônica da constituição do homem moderno em todas as suas dimensões, é igualmente certo que assistimos à manifestação deste protagonismo aos quatro ventos.
Daí pode-se verificar a importância do jornalismo para a compreensão do passado de Ponta Grossa. E mais, todo o movimento independente de constituição do jornalismo, suas dificuldades e proezas, contadas pelo fazer diário, por pessoas que presenciaram estas transformações, por pesquisadores que já se debruçaram sobre arquivos para ver no passado o reconhecimento do presente.
Miguel Morey observa que
no curso do conhecimento do passado subitamente se produz algo como uma interrupção, isso que olhamos se torna opaco como um espelho e nos vemos a nós mesmos, assinalados por estes homens do passado como o que somos, como o futuro que os aguardava. Reconocimento del ahora, chamava W. Benjamin a esse transe cognoscitivo, entendendo-o como uma manifestação que iluminava a história, que dizia exatamente o peso do presente. (MAROCCO 2004, p 09)
Ao buscar o passado, reconhece-se como a história da cidade passeia nas páginas dos jornais e como o jornalismo se constrói a partir dos fatos. Em Ponta Grossa, uma cidade do interior do Paraná, os discursos aparecem arraigados ao texto jornalístico. Os discursos estão ali, por baixo das letras, entre as linhas, basta um olhar ao passado para se reconhecer o choque do presente.
Por isso a importância de descobrir, verificar o que existe por trás do que vemos hoje. E é só buscando a origem da mecânica, ou seja, da forma em que o fazer jornalístico se constitui é que se pode tirar conclusões elucidativas. Para Traquina (2004, p.203) o poder dos media não está só (nem principalmente) no seu poder de declarar as coisas como sendo verdadeiras, mas no seu poder de fornecer as formas sob as quais as declarações aparecem.
Destaca-se aqui a importância da definição de poder usada para esta pesquisa. A partir da contribuição de Foucault (1985, p. 88 -89), compreende-se o poder como uma
multiplicidade de correlações de força imanentes ao domínio onde se exercem e são constitutivas de sua organização; o jogo que, através de lutas e afrontamentos incessantes as transforma, reforça, inverte; os apoios que tais correlações de força encontram umas nas outras, formando cadeias ou sistemas ou, ao contrário, as defasagens e contradições que as isolam entre si; enfim, as estratégias em que se originam e cujo esboço geral ou cristalização institucional toma corpo nos aparelhos estatais, na formulação da lei, nas hegemonias sociais...
Para compreender o poder da mídia e das outras instâncias de poder, é pertinente a definição de discurso jornalístico proposta por Marocco (2004, p 19):
A noção foucaultiana de discurso possibilita conceber o discurso jornalístico como uma violência que exerce sobre os acontecimentos e os indivíduos; como uma dupla coação: a das regras e técnicas propriamente jornalísticas que marcam os limites de um tipo de saber que pretende se diferenciar em um domínio próprio, e a dos discursos não jornalísticos que marcam a interferência sobre o domínio jornalístico das diversas instancias de poder.
O que fica claro é que existem muitas forças que perpassam o jornalismo, como a política, a religião, a medicina, a escola, a ordem etc. Mas, ao fazer parte do discurso jornalístico, estas forças se vestem de uma outra roupagem, das características próprias do jornal.
Por isso o jornalismo é também um produtor de poder. Constatar como esse poder é constituído, quais as forças que interagem ou se chocam (entram em contradições), é um objetivo a ser perseguido pela pesquisa, considerando a história da imprensa em Ponta Grossa. As notícias não acontecem somente porque são "espelho do real", ou porque a força política hegemônica a manipula, mas por uma série de interesses e dispositivos que constitui o universo da notícia.
Traquina (2004, p. 203) afirma que os jornalistas têm a decisão ultima de decidir o que é a notícia, sabendo que a notícia dá existência pública aos acontecimentos ou à problemática. O jornalista tem o poder de holofote (iluminar assuntos, fatos) e de megafone (tornar um assunto ou um fato público).
Segundo Foucault (1985, p.90), “as relações de poder não estão em posição de superestrutura, com um simples papel de proibição ou de recondução; possuem, lá onde atuam, um papel diretamente produtor”.
Os diversos segmentos da sociedade precisam se articular numa forma constitutiva da informação para se fazer representar no campo jornalístico. É importante perceber as diversas correntes de pensamento num discurso; o que está por trás do fato noticiado e do não noticiado (o silêncio como forma de demonstrar o poder). Diversos setores da sociedade, políticos, econômicos e culturais, buscam uma “boa relação” com a imprensa, reconhecendo que existe um poder muito grande nas mãos dos jornalistas.
Historicamente, os principais jornais serviam de porta-vozes dos decretos oficiais do governo, tendendo para o momento político que privilegiasse o meio. Em muitos casos, o jornalismo se torna um campo aberto onde estratégias políticas são colocadas em prática, onde hegemonias cristalizadas pautam os acontecimentos.
Ponta Grossa, durante boa parte da sua história, também foi marcada por uma relação estreita entre jornalismo e política. Muitos donos de meios de comunicação eram e ainda são políticos. Usam o poder do jornalismo para instaurar um discurso que apresenta diversas contradições. Apesar da política estar presente no jornal, nota-se que muitos outros interesses passam por ele, como por exemplo, a aceitação junto ao público-alvo, as tradições religiosas e culturais da cidade, o relacionamento com os anunciantes e financiadores do meio, etc.
O presente estudo, dialogando com a perspectiva da teoria interacionista do jornalismo, procura reconhecer como os jornalistas e jornais participam ativamente da construção da realidade. Segundo Traquina (2004, p 204), as notícias são uma construção social, onde a realidade é uma das condições que ajuda a moldar as notícias. As notícias também refletem: 1) os aspectos manifestos no acontecimento; 2) as narrativas daqueles que governam o que os jornalistas escrevem; 3) A influência do dono do jornal e o imperativo econômico; 4) As rotinas que orientam o trabalho e que condicionam toda atividade jornalística; 5) os valores - noticia dos jornalistas; e 6) as identidades das fontes de informação com quem falam.
Campos Gerais e Ponta Grossa
É importante a elucidação das características territoriais e da localização dos Campos Gerais e, especialmente, da cidade de Ponta Grossa, apontando os aspectos culturais, sociais e políticos que delinearam o cenário onde a imprensa surgiu.
Os Campos Gerais constituem uma estreita e longa faixa de terras, localizadas no segundo planalto paranaense, caracterizada por extensos campos limpos entrementes a poucas regiões de mata. Segundo Auguste de Saint-Hilare (1978, p. 15),
trata-se de um desses territórios que, independente das divisões políticas, se distinguem de qualquer região pelo seu aspecto e pela natureza de seus produtos e de seu solo; onde deixam de existir as características que deram à região um nome particular – aí ficam os limites desses territórios. Na margem esquerda do Itararé começam os Campos Gerais, região muito diversa das terras que a precedem do lado nordeste, e elas vão terminar a pouca distância do registro de Curitiba, onde o solo se torna desigual e as verdejantes pastagens são substituídas por sombrias e imponentes matas.
O desenvolvimento dos Campos Gerais se deu, de forma especial, por causa de suas origens enquanto entroncamento e pontos de parada dos tropeiros que por aqui passavam, com o objetivo comercial. Mas do que parada, as cidades dos Campos Gerais eram pontos de comércio, onde muitas pessoas fixaram moradia levando em consideração a possibilidade de crescimento.
O comércio de muares feito na feira de Sorocaba tinha por objetivo abastecer a região das Minas Gerais. Para isso tropeiros vinham do Rio Grande do Sul, região de rebanhos, cortando toda a região de Santa Catarina e do Paraná até chegar à famosa feira. Os tropeiros passavam cerca de nove meses viajando, sendo necessário parar em diversos pontos do caminho, alimentando o comércio local, seja através do consumo ou trazendo encomendas de fazendeiros.
Os Campos Gerais eram o caminho mais seguro para as tropas de gado vindas do Sul com destino a feira de Sorocaba, sendo parte do famoso “Caminho de Viamão”. As cidades surgiram nos pontos de parada, onde o gado invernava e os tropeiros tinham pouso. Assim surgiu Ponta Grossa, Castro, Palmeira, Tibagi, Irati e a maioria das localidades que se conhece hoje.
A Paróquia do Iapó dá origem à cidade de Castro em 1788. A localidade é a primeira região a ser habitada nos Campos Gerais. Sua influência política e econômica sobre a região se estendeu durante os séculos XVIII e XIX.
Ponta Grossa surge no século XVIII sob a jurisdição da Comarca de Castro. Conforme citado em Pinto e Gonçalves (1983, p. 18), “o povoado se constituía basicamente de um grupo de fazendas que começaram a convergir para o ponto mais central de seu território que, se por um lado se restringe espacialmente, por outro se amplia socialmente”. O povoado foi elevado a categoria de freguesia em 15 de setembro de 1823 e tornou-se cidade em 1862.
Segundo Perrinchelli (1997, p. 18), “estas transformações acompanhavam o movimento político e econômico do estado que substituía o tropeirismo por outros ciclos, como o da madeira, da erva mate e o comércio de outros produtos que aumentaram a importância da cidade como entreposto comercial”.
A partir da segunda metade do século XIX, o governo brasileiro promoveu a imigração não portuguesa para a região, com o objetivo de resolver a falta de mão-de-obra na lavoura devido ao fim da escravidão e o povoamento de extensos vazios demográficos. Grupos de etnia francesa, japonesa, alemã, austríaca, polonesa, ucraniana, italiana, síria, libanesa, russa-alemã. A contribuição dos imigrantes para a cultura, a economia e a política local foi importantíssima. Muitos desses colonos tornaram-se comerciantes, industriais, políticos, tornando-se cidadãos ativos da sociedade.
Na história de Ponta Grossa merece destaque a contribuição dos russos-alemães. Eles eram descendentes alemães que constituíram colônias na Rússia e por isso são assim denominados. Convidados pelo o imperador Dom Pedro II, os russos-alemães vieram para Ponta Grossa para cultivar cereais.
Entretanto, a colonização seguiu outras vias econômicas. As terras doadas pelo governo eram improdutivas, não existia assistência técnica ao plantio e os colonos foram submetidos a péssimas condições de vida. Esta situação causou a reimigração de colonos mais abastados para os Estados Unidos e a Argentina que ofereciam um maior suporte aos imigrantes.
Os colonos que não tinham condição de financiar as viagens, em sua maioria, abandonaram o campo vivendo do pequeno comércio, da criação de gado, do aluguel de campos para a invernada, na instalação de açougues e curtumes. Trabalhavam ainda na abertura e manutenção de estradas com os seus “carroções”, o que se tornou primordial para circulação de mercadorias vindas das pequenas cidades para os centros comerciais. Muito da produção da erva mate, por exemplo, era escoada através dos carroções.
Perrinchelli (1997, p.24) mostra que os imigrantes fundaram escolas e clubes recreativos em Ponta Grossa. Organizavam bailes e festividades folclóricas tradicionais. Os alemães fundam o Clube Germânia; os africanos o Clube 13 de Maio; os poloneses, a Sociedade Polonesa Renascença; os sírios e libaneses, a União Syria Pontagrossense; os italianos, o Dante Alighieri.
A própria imprensa de Ponta Grossa tem Jacob Holzmann[4], russo-alemão, como “pai”, por ser ele o criador do jornal Progresso, que mais tarde se chamou Diário dos Campos. Holzmann ainda foi regente da Banda Lira dos Campos e por causa dela, construiu um dos principais espaços culturais da cidade, o Cine Renascença.[5]
Aliado à presença dos imigrantes, outro fator primordial para a urbanização da cidade foi a instalação das ferrovias. Em 1893, Ponta Grossa tornou-se o ponto terminal da Estrada de Ferro do Paraná (E.F.P.R.) ligando-se diretamente com a capital do Estado e com o litoral paranaense, em especial com o Porto de Paranaguá. Em 1896 aconteceu a instalação da Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande (E.F.S.P.R.S.). Em Ponta Grossa ficaram a Estação Central e as oficinas dessa ferrovia.
Em apenas 18 anos, entre os censos de 1890 e 1908, a população de Ponta Grossa quase triplicou, passando de 4774 moradores para mais de 15000 no último censo. Comparando com Castro, que passa de 10319 para 13700, verifica-se o desenvolvimento urbano da cidade.
Ponta Grossa configurou-se, assim, em ponto obrigatório de passagem para mercadorias e pessoas que se deslocavam pelo estado do Paraná. A cidade abandona seu caráter rural e toma o caminho da urbanização. A localização privilegiada quando aliada à implantação das ferrovias causou um desenvolvimento veloz, dinamizando o comércio, a industria e a vida urbana.
Mas, além de sua importância econômica, a ferrovia representa o acesso dos pontagrossenses ao mundo cultural dos grandes centros do país como São Paulo e Rio de Janeiro. As fontes de notícias, as apresentações artísticas e a passagem de políticos atraiam a atenção dos pontagrossenses que recebiam seus visitantes com bandas, solenidades e eventos.
A vinda dos imigrantes e a instalação das estradas de ferro propiciaram o desenvolvimento da imprensa em Ponta Grossa. Segundo Perrinchelli (1997, p 28), existia um engajamento entre os movimentos artístico-culturais da cidade, onde um movimento estimula o outro, consolidando uma produção local. É no enlace destas amarras que surge a imprensa.
A imprensa de 1893 a 1940
A imprensa pontagrossense, acompanhando uma tendência do jornalismo brasileiro no final do século XIX e início do século XX, passa a representar as mudanças de um município que se urbanizava e ganhava destaque no cenário político e econômico do Paraná.
Ponta Grossa era uma vila que cresceu rapidamente a partir da instalação das ferrovias na cidade. Uma invasão de imigrantes, migrantes, pessoas de todos os lugares do Brasil, escravos recém-libertos, artistas, tropeiros, operários, pessoas de diferentes concepções políticas, e toda uma variedade cultural que descia pelos vagões da Estação Ferroviária e vinham constituir moradia na cidade. Muitos grupos criavam jornais para expressar suas idéias, vender elogios à cidade, potencializar a cultura ou criticar o poder vigente através das páginas impressas. Os jornais efêmeros talvez sejam um grande exemplo desta efervescência por se fazer representar. Segundo Cruz (2000, p.19),
a partir da última década do século XIX, seja através da incorporação das novas formas de produção e representação, seja através da construção de temáticas e formas de contar, o povo e a cidade intrometem-se nas páginas da imprensa.
Os jornais de Ponta Grossa, até a década de 1940, não separam o posicionamento político de seus diretores do conteúdo da notícia. Fica claro, através da análise de seu principal veículo, O Progresso (mais tarde Diário dos Campos), a existência de notícias marcadas por valores políticos e forte presença da opinião.
Pode-se dizer que, de forma geral, os jornais que se diziam informativos eram uma mistura do velho jornalismo partidário com marcas de interesse comercial. Isto se dá porque somente as assinaturas e anúncios não supriam as despesas dos jornais, necessitando de apoio da prefeitura municipal ou de grupos políticos para sobreviverem. Por isso, muitas folhas tinham uma vida curta, em que, ao findar o apoio político ou no momento do desinteresse, o jornal desaparecia. Outros que não recebiam apoio estavam fadados à efemeridade.
Na apresentação de Pilotto (1973) e com as contribuições dos dados levantados por Fernandes (2003, p. 421-461) estima-se que existiram aproximadamente 100 veículos de comunicação impressa catalogados em Ponta Grossa desde 1893 até a década de 1940, entre jornais, revistas e folhetins.
Entre essas publicações existiam muitas temáticas abordadas. Jornais que se preocupavam em representar instituições já estabelecidas, tornando-se porta-vozes, seja como uma forma de difundir suas idéias ou como uma legitimação de sua presença e importância na sociedade. Existiam jornais literários, humorísticos, religiosos, estudantis, operários, etc.
Segundo Piloto (1973, p. 01), a história do jornalismo impresso em Ponta Grossa começa com o surgimento do jornal Campos Geraes, de João Rocha Bahls, em 13 de maio de 1893. O jornal tinha quatro páginas. Toda primeira página é ornada com vinhetas e contém os dizeres “Homenagem à Confraternização dos Brasileiros: Salve Lei nº 3353 de 13 de Maio de 1888–1893 – Trabalho e Honra”.
O redator do jornal, Afonso Gama, abolicionista e literato, escreveu no primeiro número:
“Tomando por lema o que vimos dizer, trataremos nas colunas deste semanário de todos os assuntos que possam interessar à humanidade ao Paraná e às localidades centrais e que, por serem de grande alcance, hajam de merecer o consenso dos homens de bem”. (HOLZMANN 2004, p 298)
Em seguida, aparece no cenário pontagrossense o jornal Gazeta dos Campos (1899) sob a pena do jornalista Teixeira Coelho, que se configurou numa das personalidades da imprensa no início do século. Segundo Pilotto (1973, p 02), o jornal apresentava matérias densas sobre diversos assuntos, apesar da ausência de rigor seletiva das mesmas.
Com a instalação da oficina gráfica do republicano Albino Silva, seguido por seu filho Aldo da Silva, vários outros jornais, todos de existência efêmera e sob diversas orientações, foram criados na cidade na primeira década do século, como o Jubileu Operário (1903) de Teixeira Coelho; Luz Essênia (1905), órgão da maçonaria pontagrossense de Aldo Silva e dirigido por Teixeira Coelho; O Pigmeu, humorístico de Albino e Aldo Silva.
Destaca-se ainda O Escalpello (1908), jornal de caráter anarquista e anticlerical, vinculado ao Centro Livre Pensador (grupo formado por intelectuais do início do século com o ideal do livre-pensamento e de concepções racionalistas), e contava com artigos de Hugo dos Reis, Teixeira Coelho, Gigi Damiani (anarquista italiano, que passou pela colônia Cecília em Palmeira (PR), escreveu para jornais em Curitiba e São Paulo, e foi expulso do Brasil em 1919), entre outros.
Surge também, em 1904, o jornal “O Commercio”, sob a liderança de Aldo Silva. Este semanário de cunho político, segundo as palavras de Holzmann (2004, p 262), não conseguiu o apoio de leitores e anunciadores, e ainda provocou a hostilidade de políticos da cidade. Tanto que Aldo Silva achou prudente sair de Ponta Grossa. Venderia a tipografia fundada por seu pai e o semanário. Caso não encontrasse comprador, rumaria para Itararé no Estado de São Paulo, levando consigo a tipografia e o gráfico, João Antunes de Oliveira, que era também trombonista da Banda Lira dos Campos.
Somente Jacob Holzmann se interessou em comprar a tipografia. O maestro da Lira dos Campos, segundo Holzmann (2004, p 263), não podia perder João Antunes, figura imprescindível para a banda. Além disso, Jacob Holzmann afirma que, como entusiasta que pregava o progresso da cidade, sentia-se constrangido junto aos seus colegas que desconheciam a terra, diante do fato de Ponta Grossa não possuir imprensa.
“ – Quantos jornais há? São diários?”
“ – Não temos jornais nenhum. Já tivemos, mas se acabaram!”
“ – Então não há progresso em sua terra.”
“ Assim, tinha eu de concordar, reconhecendo que numa terra sem imprensa não há efetivamente progresso” HOLZMANN (2004, p 263)
Jacob Holzmann funda O Progresso, jornal que, a partir de 1913, passou a se chamar Diário dos Campos, já de propriedade da Companhia Tipográfica Pontagrossense. Historicamente, a cidade considera O Progresso como o primeiro jornal de Ponta Grossa. Isso acontece porque este veículo resistiu às dificuldades financeiras e teve circulação ininterrupta de 1907 a 1990, retornando em 15 de setembro de 1999 até os dias atuais.
Jacob Holzmann foi proprietário de O Progresso até 1911. Exerceu ainda a função de gerente, se desligando definitivamente em 1914. Entretanto, permaneceu por muitos anos anunciando no jornal. Em razão de sua atuação frente ao jornal, Jacob Holzmann foi chamado por José Cadilhe, jornalista em diversos órgãos de Imprensa de Ponta Grossa, de “Fundador da Imprensa de Ponta Grossa”.
Em 27 de Abril de 1907 saiu a primeira edição de O Progresso, batizado com esse nome, conforme aponta Holzmann (2004, p. 265), pelo Coronel Diogo de Oliveira Penteado, Manoel Xavier Pereira e Capitão José Baily Ribas. O redator era Augusto Silva, engenheiro da estrada de ferro São Paulo – Rio Grande.
Hugo dos Reis, na edição comemorativa dos 08 anos do jornal relata uma outra versão para a origem do nome:
Faz hoje oito anos que veio à luz um “pequerrucho”, conforme mostra o retrato da nossa primeira página, o qual era para receber o nome de “O Pontagrossense”, mas, devido ao seu raquitismo, não pode comportar este extenso nome, e foi então que o batizaram de “O Progresso”, cujo nome antigo e batido veio a calhar, porque não só ele progrediu, como toda a cidade o acompanhou na mesma vereda. (PILOTTO 1973, p. 05).
Conforme relata Epaminondas Holzmann, filho de Jacob Holzmann e primeiro entregador do jornal, a edição inaugural teve uma tiragem de 500 exemplares. A partir do segundo número fica clara a dificuldade do jornal, que não possuía assinantes, apoio político ou comercial.
O jornal passou por muitos apuros. O prelo não prestava, era preciso comprar outro. O tipógrafo não fazia a quarta parte do trabalho e O Progresso também não recebia ajuda da Prefeitura Municipal.
“O Progresso, que nasceu num pequeno quarto da antiga residência de Manoel Cirilo Ferreira, na rua 7, era impresso numa prensa ridícula, das primeiras que surgiram no país e, por certo, aposentada desde os tempos de Gutemberg... A impressão, feita página por página, exigia dois operadores: um munido de pequeno rolo, passava a tinta na página apertada contra a rama, enquanto o outro colocava o papel e descia a alavanca. Com isso, a tiragem de 300 exemplares – quantidade a que ficou reduzida à vista das devoluções – demandava mil e duzentas prensagens, ou seja, pelo menos meio dia de serviço”. (HOLZMANN 2004, p 267 – 268)
As dificuldades financeiras do jornal foram grandes durante todo período estudado, especialmente nas duas primeiras décadas de sua existência. O jornal não dava lucros a quem nele investia, mal dando para pagar os salários dos funcionários. Pode-se afirmar que o jornal sobreviveu pelo que representava e não por lucratividade. A sobrevivência do periódico pode ser explicada pelo apoio do grupo político de Eliseu dos Campos Melo, que foi prefeito da cidade em 1928.
Em 1908, o jornal passa de semanário para três números por semana. Segundo Holzmann (2004, p 268), foram instalados prelos cilíndricos movidos a pedal, máquinas de cortar papel maiores e novas fontes de tipos. Esse equipamento, de origem alemã, foi comprado em Curitiba de segunda mão. O novo prelo era de ação manual: uma manivela ligada a uma polia, que um gráfico fazia girar com esforço durante quase duas horas, sendo revezado por alguns colegas.
O redator-chefe passa a ser o fluminense João Dutra, outro integrante da São Paulo – Rio Grande. Passou pela redação, nesse mesmo ano Teixeira Coelho e Virgolino Brasil.
No final de 1908, o fluminense Hugo Mendes Borja dos Reis torna-se redator de O Progresso. Figura importante da historia do jornalismo pontagrossense, Hugo acompanha o jornal até 1921, assumindo a direção do jornal entre 1915 e 1921. Era socialista, anticlerical e apoiou o movimento operário de Ponta Grossa. Epaminondas Holzmann o considera “o homem que consolidou a imprensa pontagrossense”.
No dia 1º de Maio de 1909 surge, com tiragem diária, o jornal Diário do Paraná comandado por Abraham Glasser. O referido veículo tinha o apoio de muitos políticos e cidadãos de Ponta Grossa com o objetivo de fazer frente ao O Progresso, especialmente a Hugo dos Reis e João Dutra, os redatores.
Retratado por Holzmann (2004, p 271 – 280) e pelo O Progresso de 1º de junho de 1909, uma disputa social e política culminou num fato de relevância para a imprensa pontagrossense da época. Um grupo político[6] da cidade pretendia empastelar o jornal, usando como motivo estopim as críticas de João Dutra, através das páginas do jornal, ao engenheiro-fiscal do governo junto a Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande, dr. Gaston Sengés.
Segundo Holzmann (2004, p 273), Hugo dos Reis, então secretário do jornal, escreve: “Há poucas horas disse aqui ao colega Aldo Silva: um jornal que não agita a opinião não presta para nada”.
No dia 28 de Abril de 1909, tais políticos e muitos capangas com passagem pela polícia aportaram em frente ao jornal para expulsar João Dutra, um senhor de 70 anos, da cidade. Hugo dos Reis saiu em sua defesa. Entretanto as palavras do jornalista de nada adiantaram, pois, Hugo dos Reis e João Dutra foram espancados e o último foi embarcado à força no primeiro vagão com destino a São Paulo. Os capangas desferiram ainda pancadas contra o velho prelo, mas o prejuízo, segundo Holzmann, foi mínimo, pois, em vez de danificar as caixas de tipos, só investiram contra a máquina de impressão e nem sequem enxergaram a 2ª e 3ª páginas do jornal já prontas nas bolandeiras.
Depois do fato houve uma grande revolta nos setores que apoiavam o jornal. Liderados pelo coronel Henrique Thielen e Eugênio Grisand, muitas pessoas de destaque social saíram em defesa de O Progresso, obrigando os agressores a viajar para Curitiba e aos capangas a sair da cidade. Montaram ainda uma comitiva para buscar João Dutra em Itararé (SP). Ponta Grossa o recebeu com muitas honras e prestaram diversas homenagens também a Hugo dos Reis, que ainda se recuperava, e a Jacob Holzmann, dono do jornal.
O prelo foi restaurado, e a edição de 1º de junho exaltava a vitória de O Progresso que não paralisou suas atividades, mesmo com o ataque. No mesmo ano, o jornal Diário do Paraná encerrou as suas atividades.
Pode-se observar que O Progresso já fazia parte do imaginário popular, sendo incorporado como parte integrante da sociedade da época. O periódico alimentava ainda um discurso que encontrava ecos em muitos setores da sociedade pontagrossense, seja sob a forma de apoio ou de combate.
Em 14 de junho de 1910, Hugo dos Reis tornava-se redator-chefe de O Progresso. Reis expõe, na primeira página, a visão que tem do jornalismo naquele momento:
Assumimos a chefia do jornal
Repitamos: a imprensa é o tribunal do Povo; a imprensa é o órgão de um quarto poder, o quarto e primaz, governativo e anonymo, o poder popular. (O PROGRESSO, 10/06/1910).
Entretanto, Holzmann (2004, p 285 – 286) afirma que o periodista deixa o posto em 08 de maio de 1911, compreendendo que era necessário arranjar um emprego mais rendoso, para poder casar. Depois de casado, Hugo dos Reis lança o jornal Correio dos Campos em 1º de Janeiro de 1912.
Na metade de 1911, Jacob Holzmann organizou a razão social Holzmann & Couto, para editar O Progresso, conforme relato por Holzmann (2004, p 283). O sócio era José Couto, comerciante oriundo de São Carlos (SP). Como estivesse com dificuldades com a construção do Cine Renascença, Jacob vendeu sua parte do jornal ao dr Eliseu de Campos Melo. A sociedade com Couto não deu certo, por isso Campos Melo assumiu todo o ativo e passivo da empresa.
No final de 1912, Hugo dos Reis e Jacob Holzmann voltaram para O Progresso. O primeiro como redator-chefe e o segundo na gerência. O acervo de Correio dos Campos junta ao de O Progresso, sendo tudo adquirido pela Companhia Tipográfica Pontagrossense. Entre os acionistas da razão social estavam Dr Eliseu de Campos Melo, Antonio Hoffmann, Teodoro Batista Rosas e Francisco Burzio.
O Progresso circulou até o fim de 1912, passando a ser Diário dos Campos e ostentando o subtítulo de Ex – O Progresso a partir de 1º de janeiro de 1913, com circulação vespertina e diária.
Nesse ano, Hugo dos Reis lança, através das páginas do Diário dos Campos, o “Manifesto” para fundar a Sociedade Operária de Ponta Grossa. Publicou o esboço do estatuto, de sua autoria, e noticia todas as iniciativas relacionadas com a classe trabalhadora. A Sociedade Operária começou a funcionar em junho de 1913. Segundo Holzmann (2004, p. 288), tal iniciativa foi pioneira no Paraná.
No final do ano de 1913, conforme citado por Pilotto (1973, p 5) e Holzmann (2004, p 288), surge o jornal O Paraná, editado e dirigido pelos tenentes Teopompo de Godoy Vasconcelos e José Joaquim de Andrade. O matutino dos militares tinha o objetivo fazer frente ao Diário dos Campos. Entretanto, dissonâncias dentro do exército acabaram determinando o fim do periódico, que permaneceu em circulação por mais de um ano.
Especialmente por causa das dificuldades financeiras, a Companhia Tipográfica Pontagrossense foi extinta em 1915, e os sócios passaram suas partes a Hugo dos Reis. O próprio Jacob Holzmann deixa a gerência, apoiando o jornal através da publicidade do Cine Renascença, e deixa para Hugo dos Reis o comando do jornal. Foi, assim, constituída a razão social Hugo Reis & Cia.
O Diário dos Campos, nos 12 anos em que Hugo dos Reis trabalhou nele (1909 – 1921), alimentava um discurso ufanista, voltado para os ideais republicanos. Tinha ligação com o movimento operário e por muitas vezes atraiu a ira de católicos porque Reis era espírita. Sob a sua pena, Reis fez artigos em defesa de Rui Barbosa em 1909, na chamada “Campanha Civilista”. No ano de 1920, conforme cita Silva (1994, p 161), as páginas do jornal abriram espaço para artigos em defesa do operariado, como os escritos por J. Borba, pseudônimo usado nas publicações.
Quando tomei a resolução de escrever algumas linhas em defesa dos oprimidos, não foi por ter o praser de ser agradecido por estes. Não. Cumpro o meu dever na qualidade de operário e procuro defender a minha classe das garras da miséria. (DIÁRIO DOS CAMPOS, 18/06/1920)
Hugo dos Reis, por ser espírita, apoiou o II Congresso Espírita Paranaense, atraindo sobre si e por conseqüência sobre o Diário dos Campos a reprovação de católicos da cidade. Holzmann (2004, p.293) mostra que as intrigas ficaram ainda maiores, quando Mario de Barros, secretário do jornal e também espírita, estampou o desastre do Rio Verde, em que, uma carroça virou no curso fluvial, perdendo a vida três adolescentes, filhas de poloneses e alunas da escola de freiras, as quais tinham ido a um piquenique com seu pároco.
Hugo dos Reis fica na direção do periódico até o ano de 1921, transferindo o vespertino a Felizardo Toscano de Brito. A partir de 22 de outubro daquele ano, depois de estruturada a firma Cadilhe &Cia, integrada por Eliseu de Campos Melo, Vitor Antonio Batista e José Cadilhe, o Diário dos Campos passa a circular, como matutino, sob a direção de Toscano Brito.
Em 1931, o jornal Diário dos Campos passa para as mãos de João Hoffmann (Juca). Descendente de russo-alemão, suas crônicas e o jornal como um todo, se tornava tribuna, onde as suas opiniões e valores eram constantemente colocados. Como homem político, Hoffman foi vereador, deputado e por duas vezes prefeito municipal. Destaca-se como o jornal e Hoffmann faziam parte da realidade política e social da cidade. Segundo Aída Lavalle, presente no texto de Chaves (2001, p 45),
“O Diário dos Campos dava o tom da política. Se você não gostava dele, não havia como deixar de ler. Não porque você comungava das idéias, mas para saber o que ele estava dizendo. Essa é a grande importância de Hoffman e do Diário. Pode até ser uma opinião que você não preza; mas que você não despreza, porque tanto ela pode te atacar como atacar o teu candidato”.(grifado na obra consultada)
Nessa década, Ponta Grossa atinge o ápice de seu desenvolvimento, com uma influência política muito forte no Estado. Manoel Ribas, pontagrossense, esteve na frente do governo do Paraná, nomeado por Getúlio Vargas, de 1930 a 1945. Os movimentos de vanguarda cultural na cidade são fortes. Um exemplo foi o cine Renascença, primeiro cinema do Paraná a ter som. A população da cidade aumenta consideravelmente, ultrapassando 38000 pessoas no censo de 1940.
Conforme considera Chaves (2001, p 45), no início dos anos 30, o Diário dos Campos apresentava-se como único órgão de imprensa local capaz de superar as dificuldades técnicas e financeiras que apareceram ao longo dos dois decênios de sua trajetória. O jornal apoiava e recebia o apoio do poder municipal, reproduzindo os atos oficiais e fazendo matérias que exaltavam muitos feitos do prefeito da época, o senhor Albary Guimarães.
O Diário dos Campos apresenta uma composição de quatro a oito páginas, sendo que duas delas circularam com anúncios diversos sobre remédios, creme dental, bares e serviços profissionais.
Segundo Chaves (2001, p 40), o jornal possuía agentes e correspondentes em várias cidades do interior paranaense. Em Ponta Grossa, as reportagens ficavam por conta de quatro repórteres: Joãozinho Hoffmann, Abelardo Flores e os irmãos Rosalvo e Anésio Barros. As notícias, vindas de outras cidades brasileiras como Rio de Janeiro, São Paulo ou enviadas do exterior, chegavam via telégrafo e eram publicadas com defasagem de um dia com relação aos jornais de circulação nacional.
Graficamente o jornal se manteve inalterado durante toda a década de 1930. A primeira página trazia matérias corridas, sempre com uma manchete que destacava um assunto da realidade local, nacional ou mesmo internacional. Na parte superior da primeira página constava, com destaque, o cabeçalho com o subtítulo “Jornal Independente”.
A maioria dos artigos era escrita sob a forma de notas únicas. Algumas matérias eram abordadas uma única vez, sem continuidade posterior. As matérias que recebiam uma atenção especial eram aquelas que chocavam opinião pública ou diziam respeito a interesses da cidade, como o problema no fornecimento de energia elétrica, muito debatido nas páginas do Diário dos Campos no ano de 1932.
As notícias sobre Ponta Grossa abordavam questões relativas à sociedade, aos esportes, às formas de lazer, às manifestações culturais, aos casos de polícia e, em especial, ao dia-a-dia da política local. As notícias nacionais e internacionais relatam fatos de guerra, economia, política, acidentes, guerras, catástrofes, etc. Quando a matéria de capa tratava da política nacional, a manchete vinha precedida do chapéu “Momento Político Nacional”. Já as matérias de esportes traziam o chapéu “Diário esportivo”.
O jornal apresentava algumas colunas que constavam na maioria das edições da década. “Notas mundanas” e “Locaes” eram espaços destinados a informar sobre o cotidiano da sociedade pontagrossense. Era uma espécie de coluna social, com informes sobre viagens, aniversários, nascimentos ou mortes, visitantes ilustres que chegavam à cidade. Entretanto, estes avisos mesclavam-se com cobranças de dívidas pessoais.
A coluna “O que o povo reclama” era destinada aos leitores que queriam opinar, reclamar ou criticar sobre acontecimentos locais. Trazia cartas dos leitores anônimos ou não. Desta maneira, o Diário dos Campos criava um canal de comunicação com o leitor, ganhando credibilidade da opinião pública e legitimando o discurso “de defensor do povo”.
Segundo Chaves (2001, p 44), nota-se o esforço do Diário dos Campos, sob o comando de José Hoffmann, no que diz respeito à aproximação de seu público leitor a determinadas idéias, instituições ou acontecimentos, como por exemplo, a Igreja Católica, a ordem republicana, a obediência civil, a civilidade e o progresso, etc.
O Diário dos Campos procura alimentar um discurso de auto-afirmação, defendendo o posicionamento dos redatores do jornal e dos ideais defendidos por eles. O jornal representava os interesses de um grupo, o que anunciava em suas páginas e no qual os jornalistas pertenciam. As idéias e o modo de interpretar os fatos partiam desse grupo.
Perrinchellli (1997, p.37) afirma que o Diário dos Campos constrói uma realidade social junto ao imaginário coletivo no momento em que sugere um modo de interpretar e vivenciar os acontecimentos e fatos sociais.
Este artigo trabalha com o Diário dos Campos como principal fonte. O mapeamento tem como próximos objetivos, analisar com maior ênfase os principais periódicos efêmeros, até para que se possa representar muitos movimentos intelectuais, políticos e sociais importantes na cidade. É importante verificar outras fontes impressas como os jornais anticlericais, os jornais culturais e operários.
“A história da imprensa, afinal, é a história da comunidade porque, através das crônicas, das seções, dos noticiosos, dos bate-bocas de órgãos rivais, o que brota de forma cristalina, é a realidade palpitante (...). Por isso, entendemos que a relembrança de jornais grandes e pequenos, sérios ou pueris, é algo de útil no resgate da memória de qualquer povo”. FERNANDES (2003, p. 461)
Referências
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[1] Este texto é parte de uma pesquisa, em andamento, vinculada ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq) da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)
[2] Felipe Simão Pontes (felipe271184@yahoo.com.br) é acadêmico do 3º ano do Curso de Comunicação Social/ Jornalismo da UEPG.
[3] Jornalista, dr em ciências da comunicação, professor do Curso de Jornalismo da UEPG/PR.
[4] Jacob Holzmann, russo alemão que chegou ao Brasil em 1877, então com dois anos de idade, fixou residência em Ponta Grossa em 1895. Residiu em Curitiba, onde foi representante da “Universal Pictures do Brasil”, daí as suas ligações com o cinema. Em Ponta Grossa, Jacob fundou o “Cine Renascença” o mais importante da cidade durante as décadas iniciais do século XX. Autodidata, não chegou a concluir o primário, mas sempre esteve ligado com questões culturais e artísticas. Fundou jornais e cinemas. Foi benemérito da imprensa em Curitiba. Foi membro da Associação Brasileira de Imprensa. Foi regente de banda, de conjuntos musicais e até mesmo de orquestras sinfônicas. Faleceu em 1933, aos 58 anos de idade no Rio de Janeiro. Foi sepultado em Ponta Grossa. (CHAVES 2001, p.55)
[5] No início do século o cinema era mudo e eram as bandas que tocavam para animar os filmes.
[6] O grupo político tinha como seu principal destaque o Dr Abraão Glasser, ex-prefeito de Ponta Grossa e adversário político do grupo de Dr Eliseu de Campos Melo, a quem Reis, por meio do jornal, apoiava. (CHAVES 2001, p. 56).